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UNFPA chama atenção para saúde sexual e reprodutiva de migrantes e refugiadas LGBTI

13 out, 2018 | Fonte: ONU BR

Conexões, troca de experiências, empatia, resiliência e sororidade. Essas foram as palavras que guiaram as atividades promovidas pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA)durante a 4ª Conferência Internacional SSEX BBOX – Sexualidade Fora da Caixa, realizadas em São Paulo na sexta-feira (21). No evento, o UNFPA e outras agências da ONU organizaram debates sobre direitos sexuais e reprodutivos e atividades interativas com o público.

A primeira atividade foi a roda de conversa “Sem Fronteiras: Mulheres LBT em Trânsito”, onde foram debatidos os desafios para que os direitos humanos da população LGBTI em situações de migração e refúgio sejam respeitados, em especial os direitos sexuais e reprodutivos.

A segunda atividade, denominada “Direitos Sexuais e Reprodutivos e Intervenção Urbana”, foi uma oficina de lambes que ajudou a mostrar uma forma de intervenção urbana mais segura para as mulheres. No mesmo dia, também foi realizado o workshop “Livres e Iguais: 5 padrões de conduta para empresas no enfrentamento ao preconceito com pessoas LGBTI”.

A roda de conversa foi promovida pelo UNFPA e pela Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), com apoio do Escritório do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos (ACNUDH), no âmbito da Livres & Iguais – a campanha das Nações Unidas pela igualdade de direitos da população LGBTI. A oficina de lambes foi promovida pelo UNFPA, com apoio do ACNUDH, e o workshop por ACNUDH, com apoio de UNFPA e ACNUR.

Para a roda de conversa, foram convidadas mulheres transexuais, bissexuais e lésbicas em situação de migração e refúgio. Também participaram representantes do coletivo LGBT+Movimento, por meio da Redes de Afeto para Deslocades, Migrantes e Refugiades LGBTTQIA+, e da Rede de Mulheres Imigrantes Lésbicas e Bissexuais (MILBI). No total, cerca de 20 participantes estiveram na roda de conversa.

Muitas das pessoas que vêm para o Brasil como refugiadas ou migrantes fogem de situações de violência e violação de direitos também por serem LGBTI. Buscando amenizar problemas causados por essa situação, Redes de Afeto para Deslocades, Migrantes e Refugiades LGBTTQIA+ tem sido criadas com apoio do coletivo LGBT+Movimento, desde julho de 2017. A ideia é sensibilizar e articular redes que facilitem a integração e o acolhimento dessas pessoas quando chegam ao Rio de Janeiro, além de promover o conhecimento das políticas públicas voltadas para essa população e incentivar a denúncia sobre situações de violação de direitos.

Nas redes, pessoas LGBTI migrantes e refugiadas podem compartilhar os motivos de seus deslocamentos e experiências de violência. Em troca, encontram apoio para superar as dificuldades e espaço para conhecer seus direitos. “Essas pessoas existiam, mas ficavam em um não-lugar. Com as redes, buscamos visibilizar o tema e divulgar um pouco do que está acontecendo no resto do mundo”, destaca uma das fundadoras, Marina Siqueira. “Buscamos explicar o que está na lei, mas como acontece na prática”, completa.

Para pessoas nessa situação, “alugar uma casa é muito difícil, fazer um contrato é muito difícil”, pontua outra representante da iniciativa, Nathália Antonucci. Ela também destaca a importância de locais informais de encontro e apoio para que as pessoas consigam se expressar e buscar conforto. “É na informalidade que a gente fala das nossas dores, daquilo que a gente está precisando falar”, ressalta.

Já a Rede de Mulheres Imigrantes Lésbicas e Bissexuais (MILBI), criada em 2017 em São Paulo, busca fortalecer mulheres cis ou transgêneras vindas de outros países que sejam lésbicas e bissexuais, e que, muitas vezes, tem de lidar com desafios envolvendo questões migratória, de gênero e de sexualidade. Segundo a migrante Maria Paula Rodriguez, representante da MILBI, as mulheres deslocadas necessitam sentir-se representadas e acolhidas. “Se ser mulher lésbica no Brasil, sendo brasileira, já é difícil, ser uma mulher lésbica migrante, refugiada ou apátrida é um desafio ainda maior”, relata.

História de Vida

Para contar as histórias destas pessoas de maneira fiel e retirá-las da invisibilidade social, Keyllen Nieto observa a importância da construção de narrativas humanizadas. “Nossas experiências são atravessadas pelas multiplicidades e muitas vezes não são apresentadas todas as formas de ser. Na experiência de migração, mulheres estão sujeitas a experiência como o racismo, machismo e homofobia, o que nos torna uma minoria social ainda mais vulnerável”, relata a migrante.

“Sofri agressões de todos os tipos no meu país. Eu e minha namorada já fomos presas pela polícia”, lembra a moçambicana Lara Lopes. Segundo ela, a maneira como se vestia, fora dos padrões estabelecidos para as mulheres, causava, e ainda causa, muito estranhamento e constrangimentos.

“Procurava emprego e não conseguia pela forma como me vestia. As pessoas queriam saber porque eu me vestia dessa forma”, diz. Lopes mostra que não estar nos padrões esperados também refletiu em sua sexualidade. “Minha mãe não falava sobre sexualidade comigo, não tinha com quem conversar. E para ser quem sou, eu tive que sair do meu país, eu tive que deixar meu país”.

Oficina de arte urbana

Também pensando no direito das mulheres lésbicas de ir e vir, de manifestar afeto e ter sua liberdade garantida, a roda de conversa foi seguida por uma oficina de lambe, uma vertente da arte de rua que utiliza cartazes como intervenção urbana.

A ação “Direitos Sexuais e Reprodutivos e Intervenção Urbana” foi promovida pelo UNFPA e pela campanha Livres & Iguais em parceria com Julianna Motter, representante da @velcrocheque. Na ocasião, as mulheres puderam transformar suas experiências em cartazes com mensagens que representam suas inquietações e particularidades.

“A rua apresenta vários riscos para as mulheres e o lambe é uma intervenção um pouco mais segura porque é rápida de fazer: você não fica exposta na rua por muito tempo. Então, você consegue intervir com algo muito relevante de maneira muito mais rápida e segura em comparação a outros tipos de intervenção, como o grafite, por exemplo”, explica a artista Julianna Motter.

“O que eu acho legal sobre a intervenção urbana, e especialmente o lambe, é que ajuda a criar um léxico sobre afetos e sexualidades diversas no espaço urbano – especialmente a lésbica, que acaba tendo uma relação de brincadeira entre lambe / lamber / colar e as práticas de mulheres que se relacionam com outras mulheres”, completa.

Segundo Irina Bacci, analista para assuntos humanitários do UNFPA Brasil, a experiência da 4ª Conferência Internacional SSEX BBOX reforça os ideais das Nações Unidas de não deixar ninguém para trás.

“Falar sobre saúde sexual e reprodutiva para todas as mulheres, independentemente da orientação sexual, é fundamental para garantir os direitos mais básicos para as brasileiras, as migrantes e qualquer mulher ao redor do mundo. Ao afirmar que toda mulher merece ter seu corpo e suas escolhas respeitadas, certificamos que estamos em busca de meios para que a Agenda 2030 do Desenvolvimento Sustentável seja atingida”, afirma.

A 4ª Conferência Internacional SSEX BBOX – Sexualidade Fora da Caixa aconteceu entre os dia 20 a 23 de setembro, em São Paulo (SP). O encontro anual reuniu pesquisadores, acadêmicos, ativistas, artistas, trabalhadores sexuais e pessoas que vivenciam questões relativas ao gênero e à sexualidade.

Em suas atividades, o evento incluiu atrações musicais, expressões artísticas, exposições, apresentações de trabalhos acadêmicos, palestras, mostra de filmes, feiras e shows. Com entrada gratuita em todos os dias, milhares de pessoas tiveram a oportunidade experienciar um ambiente de acolhimento e proteção, diferentemente do que é vivenciado no cotidiano.

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